terça-feira, 8 de dezembro de 2009

...

Ainda sou a mesma passoa de quando tinha 16 anos. Mesmo que não se tenha passado tanto tempo desde, não posso deixar de perceber que os mesmos tormentos e as mesmas angústias tem atravessado esses nove anos. As coisas, assim prefiro chamar tudo que se suscedeu de lá pra cá, não são exatamente e nem acontecem da mesma forma. Seria demais se fosse, seria o mesmo que atestar que o tempo e espaço sucumbiram à mesma hora de outrora e que nada foi retirado da sala, nem mesmo aquele velho sófa que há muito não habita nem mesmo aquela velha casa, ou mesmo aquela velha cidade. O sofá nem mais existe. Ao menos para mim. Não sei o que foi feito dele. Talvez ainda esteja servindo para alguém depositar as nádegas em algum recondito daquela velha cidade ou daquele velho estado.
Embora ainda constate que o tempo seguiu seu rumo e que o espaço se transformou e que permanece se transformando, a vida em si tem mudado pouco. (continua)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Passagens

a poeira tomou o lar,
a distância separou,
a falta preencheu o âmago,
a inércia se achou.

e todos aqui a deitar...
e as lentes fora do lugar...
e as gargantas a estourar...
e as cortinas a rasgar!

no fim, a apatia deu lugar...
no meio, a tristeza se acomodou,
no início...
não se sabia como se estaria no fim...

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Quem poderá dar lugar à mesquinhez que o acomete?!

inveja o outro
entristesse-se com suas conquistas
esquecesse-se de si
contempla a si com a mesma distância que inveja o outro

quer o outro
não consegue alcançar as mesmas vitórias
perdeu-se em si
labirintos formados e nós que não pode desatar

precisa do outro
repostas que só quem tem um lugar ao sol pode dar
acreditou em si
pensava que o mundo desse voltas e por elas o outro fosse esmagado

quer a morte do outro
não deixa a mágoa deitar-se nas ondas e fluir
sucumbe-se ao delírio
precisa ser maior que aquele que lhe feriu

quinta-feira, 23 de julho de 2009

não se sabe quando e onde...
não se sabe o por quê...
mas me avise quando acordar.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Casas minhas, minhas casas

casa vulgar:
lugar de descanso

casa de loucos:
lugar para se estar

casa de estranhos:
lugar pra beber

casa de tatu:
lugar do inferno

casa de orvalhos:
lugar para cheirar

casa das putas:
lugar pra gozar

terça-feira, 21 de julho de 2009

Mula sem cabeça

Segue pelo corpo
Lamenta a intenção dos bem intencionados
Discorre sobre o tempo sem deste saber
Sonha com asas sem ao menos saber andar

E quem dirá...
o sol se apagou no horizonte?
E quem irá...
dar a chama para que possa voltar a brilhar?

Inventa sabores para o olfato gasto
Leva armadilhas em sacolas vazias
Vislumbra o novo sem nunca ter tido o velho
Desce dos céus sem jamais lá ter estado

E quem virá...
mostrar-lhe que o dorso pode não ser belo?
E quem dissipará...
as ferrugens impregnadas das cordas desafinadas?

A vida não se fará
Os laços não desatarão
O Outro não agirá
e a vida, tomada, permanecerá caminhando sem as pernas de seu corpo

Telas pintadas sem tintas

Carruagens descem do céu

Luvas absorvem o medo

Cavaleiros carregam suas espadas

E no canto baixo do quadro a baia pega fogo

-----------------------------------------//-------------------------------------

Um risco preto corre sobre o branco

Círculos perfazem o abajur aceso

O azul permanece inerte

E no alto do quadro as lembranças se transformam em cinzas

-----------------------------------------//-------------------------------------

Pela porta entra o mouro

Mãos carregam a bandeja que será posta à mesa

Fiéis aguardam o desjejum

E no canto esquerdo do quadro, no altar, um deus travestido em fome

-----------------------------------------//-------------------------------------

A feira está parada

Alguns comerciantes olham para a maçã marrom

A mulher, de semblante preocupado, disfarça com o pepino na mão

E na penumbra do quadro, onde o sol encontrou abrigo, um homem se entrega ao gozo

-----------------------------------------//-------------------------------------

Às pinturas,

Aos jocosos,

Às pseudo artes,

Aos artistas,

Aos médicos,

Aos jornalistas,

Aos faxineiros,

Aos engenheiros,

Às putas.


Sempre haverá um pouco mais de vida...

quando pela memória se deixar enganar,

quando pelo sonho se deixar consumir,

e quando pelas cores, dispostas em seres e,ou, objetos, se deixarem narrar.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Nublado

Desabou. Pensou estar sentado em mais um desses bares onde ninguém se conhece, mas todos se cumprimentam; contudo não estava. Estava sentado em seu sofá embriagado pela sua existência, perplexo entre a vigília e o real quando de súbito perdeu os poucos sentidos que ainda lhe restava. Submerso, preso em seu próprio mundo de sonhos grotescos e imagens sombrias. Onde estava dentro de suas próprias sensações, incontroladamente disparadas por desejos vazios. Sendo assim foi mais fundo em sentidos antes inabitados. Caminhou por entre pés de oliva que ainda estavam a florescer.

A aurora lhe chegou cinzenta entre a vegetação verde e o cimento que crescia a poucos metros dali. A cidade acordava aos sons das urgências das ambulâncias, carros de polícia, britadeiras, gritos por socorro em um estupro numa esquina remota, brigas de casais, bebês chorando, crianças agonizando e homens silenciosos cansados da rotina de subir e descer as mesmas ruas por onde suas almas já jaziam há muito.

No campo, em meio a prédios e ruas, a geladeira aberta dava a entender que o calor poderia ser superado pelo gelo que brilhava dentro do congelador agora aberto. Gelo sem uísque não serve, pensou. A garrafa de Jack Daniels estava entre as folhas e os frutos de oliva, deitada, descansando na terra.. Pegou-a. Deixou que aquele líquido rasga-se seu corpo. Pediu, implorou para que aquele líquido o consumisse.

As amarras vieram. Deitaram-se ao seu lado. De tanto se olharem, conversaram. As amarras comentaram baixo, sutil em seu ouvido esquerdo, que elas eram desnecessárias. Por que não vão embora, então; perguntou. Quem nos criou e quem nos alimenta é você. Só você pode fazer com que o deixemos; retrucaram. Não posso...se me desfizer de vocês nada mais terei; respondeu ele meio atordoado.

Nem sempre o que dizem é verdade, na verdade a verdade não existe. Nada é intocável, tudo se pode e tudo se é, depende de quem olha, disse para si um pouco zonzo da conversa que acabara de ter. Em meio a divagações percebeu que ao menos o que ele tinha ou sentia era sua verdade, e ninguém, ao menos por agora poderia transpô-la. Irei para o inferno por todas as coisas sujas que penso, essa é minha verdade, diz ele em voz calma. Sente-se triste por pensar assim, um pessimista em meio a olivas. Sabe ele que a cidade está logo ali como suas ondas sonoras a lhe perturbar. Como se aqueles sons já não fossem suficientemente ruins, o modo como sua vida estava e a maneira com que ele se relacionava com as coisas e o mundo é o incomodava ainda mais. Talvez o pior fosse talvez o fato de sua vida não mais lhe pertencer e saber que ela está por aí a sua espera pronta para ser vivida. Esquecerei desta ingrata, pensou. Nada como uns devaneios para deixar viva a penumbra que insiste em preencher seu âmago. O que mais o indigna é não ser reconhecido por aquilo que acredita fazer de melhor. A arte nunca esteve longe dele, pelo contrário sempre caminhou de mãos dadas a seu lado fazendo-lhe afagos.

Os dias se sucederam na plantação de olivas. Ele já não era mais aquele de antes depois de tanto inércia que os dias ali, naquela vegetação, trouxeram. Deixou as enfermidades de lado, os olhares perdidos e a vontade de escapar para trás. Fez das olivas sua nova morada. Não queria mais, como anteriormente, resgatar sua vida que estava por aí a vagar em algum sítio, mas sim queria deitar sua cabeça na relva que hoje parece um pouco mais doce que antes e esquecer-se de viver. Esquecer-se do que é necessário e contemplar apenas o entardecer de mais um dia sem saber se para ele um novo chegará.

* escritos em itálico por Fernando Chinaski

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Se's

se se transfigura em medo,
se se transpõe sem exatidão,
se se mede o tempo com ansia,
se se prende em lanços senis,
se se ilumina sem luz,
se se vê com os olhos dos cegos,
faz-se efêmero o grão plantado na alcova em que jaz.

se se move sem movimento,
se se deita em relvas sem relvas haver,
se se presta a caminhar sem direção,
se se cobre de dúvidas sobre as dúvidas,
se se semeia o grão já morto,
se se vale do imprevisível,
faz-se vento na inércia do viver carcomido e traz úmidade para o deserto desalmado.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Dançando na lua

a bagunça exposta em meio a garrafas.
deve haver um outro modo de esquecer,
deve haver um outro jeito.
cabe decidir...
se deixa tudo aqui,
se guarda tudo lá.

sábado, 4 de abril de 2009

Panacéia

ao laço exterior da trivialidasde do cotidiano aguçado...
ligações anteriores dadas através das querelas subjulgadas.

maneira cabal da morte...
polígonos na transversalidade.

luxúria.
hedonismo.

rasgados foram os trapos nos lugares feios escondidos na escuridão...
tudo era o ontem e a célebre aurora trará uma nova manhã.

maneira cabal da vida...
linhas horizontais paralelas.

hedonismo.
luxúria.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Ainda há (?!)

caminhar...
caminhos por fazer,
lugares para abarcar...
sereias?!

para onde foram as notas?!
"vagos destinos a almejar..."
lembranças caras,
pormenores rasos.

e se houvessem mãos?!
"disputas por rostos desconhecidos..."
e se houvessem vagas?!
deitado estaria o louco sob o cantar...

fins!
"por onde andarão os meios?"
"por onde andarão?"
finitos.

restaram aqui as cantigas de outrora,
com passos que se acabam sem cessar;
difíceis traumas...
sobrou tormentos.

escadas...
quedas em bares pela madrugada.
alicerces...
beijos rápidos por algum motivo

instantes esparçados:
limiar.
instantes ultrapassados:
libertar.

e as ruas seguem...
e aquilo que se quer,
e aquilo que não se sabe,
lutam com semblantes tranquilos do novo viver.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Dos meus

trajo as vestes de ninguém,
acuado, leproso, sorumbático,
por entre ventos e vinhedos,
por entre poças de vinhos tinto.

caído no chão público,
louco, molhado, desmemoriado,
entre gritos altos e mordidas vorazes,
entre aranhas ansiosas por carnes.

de peito aberto para o céu chuvoso de ninguém,
amargo, cansado, fracassado,
deixo entrar os garfos e orvalhos,
deixo penetrar os raios e os galhos.

deitado de lado admirando o cair das gotas,
inerte, obcecado, vago,
como um pervertido e desvairado,
como um inútil desgraçado,
como um dente alho amassado,
visto o paletó surrado e cantarolo a marola entoada pelos traumas... de ninguém.